“Todos os argumentos que provam a superioridade humana não eliminam este fato: no sofrimento os animais são semelhantes a nós.”
É uma frase de Peter Singer, 62 anos, filósofo e professor australiano de Melbourne que publicou em 1975 um livro que é um marco na defesa dos animais. O livro se chama “Libertação Animal”. Singer é professor de ética em Princeton, uma universidade americana de primeira linha. Casado, pai e avô, oriundo de uma família de classe média judaica, Singer divide hoje seu tempo entre Melbourne e Princeton. Singer dá aula de ética sob o prisma do utilitarismo, ou da aplicação dela, ética, ao dia a dia.
É uma voz potente. Peter Singer apareceu em 2005 na lista das 100 pessoas mais influentes do mundo feita anualmente pela revista Time.
Singer está divulgando seu novo livro. Com ele espera usar sua influência para convencer todos nós a nos mexermos para combater a miséria. O nome do livro, ainda não lançado no Brasil, é “The Life You Can Save” (A Vida Que Você Pode Salvar).
“Se está em nosso poder evitar que alguma coisa muito ruim aconteça, sem com isso sacrificar nada moralmente significativo, devemos fazer isso”, afirma Singer. Exemplo que ele dá: você vê uma criança se afogando numa lagoa rasa. Está claro que o certo é saltar no lago e salvá-la. Suas roupas ficarão molhadas, mas e daí? Não importa se há por perto outras pessoas que vão também pular na água para salvar a criança. O moralmente certo é você saltar.
O mesmo vale para a fome. “Não existe alguma coisa errada em vivermos num mundo em que 27 000 crianças morrem a cada dia?”, diz Singer.
Imagine que com 50 reais por mês uma criança destinada à morte por falta de comida pudesse ser salva. Você daria esse dinheiro para salvá-la, assim como pularia no lago para resgatar a criança que se afoga?
Singer defende em seu livro a tese de que todos nós, que podemos, devemos ser taxados para a erradicação da miséria. Não uniformemente: paga mais quem tem mais. Ele próprio destina 25% do que ganha ao combate da pobreza extrema. Também na defesa dos animais ele oferece seu exemplo prático: é vegetariano. Ele se graduou em Oxford, a célebre universidade britânica. Lá conheceu um amigo que o iniciou na questão dos direitos dos animais e, em conseqüência, no vegetarianismo. (Dele Paul McCartney não poderia puxar a orelha como fez com o Dalai Lama ao saber que o líder budista não rejeita uns bifinhos apesar de pregar contra o sofrimento de todos os seres sencientes.)
Singer é um provocador, um “contrarian”, para usar uma expressão em inglês. Um contrariador, alguém que vai, com coragem e substância, contra a corrente. Sua defesa dos animais nos anos 70 só se tornaria mundialmente aceita e disseminada muito tempo depois. Uma amostra do seu pensamento pode ser contemplada no vídeo de uma entrevista disponível aqui.
Ele gosta de fazer o leitor pensar. Num artigo, colocou um dilema mais ou menos assim. Um veículo desgovernado está indo para cima de cinco pessoas. Você pode desviá-lo, só que uma outra pessoa vai ser atingida. Que você faria?
O provocador às vezes também é provocado. É melhor você gastar dinheiro com alguém que tenha futuro ou em alguém tão comprometido fisica e mentalmente que se torne uma “não pessoa”? Pela ética utilitária de Singer, a resposta é fácil. A revista The New Yorker, num perfil sobre Singer, provou que nem sempre as coisas são simples. Singer gastou um bom dinheiro para cuidar de sua mãe com Ahlzmeir. A visão darwiniana de escolha pelos mais aptos dá aos detratores de Singer material para acusá-lo de ser, filosoficamente, parecido com o nazismo que matou gente de sua família.
Em seu novo livro Singer conta histórias inspiradoras de gente, como ele próprio, que está ajudando a diminuir as estatísticas mortais de fome no mundo. Um magnata que doou o grosso do dinheiro para os pobres e ficou apenas com o suficiente para viver uma vida simples. Um médico que foi para um lugar remoto em que às vezes é obrigado a viajar horas para atender pacientes miseráveis.
Peter Singer desde muito tempo sonha com um mundo menos errado, em que não morram 27 000 crianças por dia.
Mas não apenas sonha. Também age.
Fonte: Vista-se
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